STF reforça limite da modulação de efeitos dos quintos incorporados

Wagner Constâncio
7 minuto(s) de leitura
Plenário reconstituido 30-01-2023 Crédito para a foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF

Segunda Turma decide que verbas reconhecidas mas não pagas até 2019 não são abrangidas por modulação no Tema 395; pagamento retroativo é vedado, mesmo com decisão administrativa prévia

Brasília, 5 de junho de 2025 — A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por unanimidade, que os valores de quintos incorporados por decisão administrativa, mas não pagos até o marco temporal de 18 de dezembro de 2019, não estão protegidos pela modulação de efeitos firmada no Tema 395 da repercussão geral. A decisão foi proferida no Recurso Extraordinário 1.393.330 AgR/RS, relatado pelo Ministro André Mendonça, e representa importante reafirmação dos limites constitucionais da modulação de efeitos em matéria de gratificação incorporada.

A Corte deu provimento ao agravo regimental interposto pela União contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que havia reconhecido o direito de um servidor ao pagamento retroativo das parcelas de quintos, apesar de essas verbas não terem sido efetivamente adimplidas pela Administração Pública até o final de 2019.

O STF inverteu o ônus de sucumbência, com ressalva à concessão de gratuidade de justiça, e consolidou a interpretação segundo a qual a proteção conferida pela modulação restringe-se exclusivamente aos servidores que já percebiam efetivamente a verba na data do julgamento do RE 638.115 ED-ED, ocorrido em 18/12/2019.

Quintos/Décimos: o que são e por que foram considerados inconstitucionais

Os chamados quintos ou décimos referem-se à gratificação por exercício de função comissionada ou cargo em comissão, incorporada aos vencimentos do servidor público a cada cinco anos de exercício. Essa sistemática teve amparo legal até a edição da Medida Provisória nº 2.225-45/2001, que revogou dispositivos anteriores, como os da Lei nº 9.624/1998, encerrando o direito à incorporação.

Contudo, durante anos, diversos órgãos da Administração Pública e do Judiciário continuaram reconhecendo administrativamente — e às vezes pagando — essas parcelas aos servidores, mesmo após a alteração legislativa. O STF, ao julgar o Tema 395 da repercussão geral, declarou a inconstitucionalidade da incorporação de quintos no período entre 8/4/1998 e 4/9/2001, mas, em respeito à segurança jurídica, modulou os efeitos da decisão.

Modulação dos efeitos: alcance e restrições

Na ocasião do julgamento do RE 638.115 (ED-ED), o STF definiu que:

  • Deveriam ser mantidos os pagamentos em curso com base em decisões judiciais ou administrativas não transitadas em julgado;
  • Mas não haveria direito ao pagamento retroativo de parcelas não quitadas até 18/12/2019;
  • E o valor da parcela incorporada deveria ser absorvido por futuros reajustes salariais.

A decisão reafirmou os princípios da segurança jurídica e da boa-fé, protegendo situações consolidadas de boa-fé que já resultavam em pagamento, mas vedando a expansão retroativa do direito a novos pagamentos, mesmo que já reconhecidos, porém ainda não efetuados.

O caso concreto e os fundamentos da decisão

No RE 1.393.330 AgR/RS, a União alegou que o acórdão do TRF-4, ao autorizar o pagamento de quintos com base em decisão administrativa não executada, desrespeitava os limites da modulação do Tema 395, e criava uma exceção inconstitucional à tese fixada pelo STF.

O relator, Ministro André Mendonça, acolheu os argumentos e reafirmou que:

  • A modulação não reabilitou a incorporação dos quintos, declarada inconstitucional;
  • E tampouco autorizou o pagamento de valores reconhecidos mas não quitados pela Administração Pública até o marco temporal;
  • Qualquer ampliação do alcance da modulação exigiria nova deliberação colegiada, o que não ocorreu.

A Segunda Turma então concluiu que, para haver proteção pela modulação, a parcela de quintos deveria estar efetivamente sendo paga até 18/12/2019, excluindo da proteção qualquer reconhecimento meramente declaratório sem adimplemento.

Consequências práticas: segurança orçamentária e respeito à jurisprudência

A decisão tem importantes efeitos para milhares de servidores públicos federais, estaduais e municipais, cujos pleitos relacionados à incorporação de quintos estavam pendentes ou envolviam valores retroativos ainda não quitados. Com o posicionamento do STF:

  • Ficam vedados novos pagamentos retroativos de quintos com base em decisões administrativas;
  • Evita-se nova pressão sobre os cofres públicos, especialmente diante do passivo potencial representado por tais parcelas;
  • Reafirma-se a necessidade de respeito estrito às modulações de efeitos proferidas pelo STF, como forma de garantir segurança jurídica no controle de constitucionalidade.

A medida também resguarda a isonomia entre os servidores, evitando que situações similares sejam tratadas de forma desigual a depender de interpretações administrativas locais ou de decisões judiciais dissociadas da tese fixada em repercussão geral.

Jurisprudência citada e contexto normativo

A decisão se alinha a uma longa linha de precedentes do STF em matéria de gratificações incorporadas e efeitos da modulação de inconstitucionalidade, destacando-se os seguintes:

  • RE 638.115 ED-ED (Tema 395 RG) – marco decisório da modulação;
  • RE 1.388.353 AgR-ED e RE 1.459.248 Rcon-ED-ED-AgR – reafirmação da vedação ao pagamento retroativo;
  • RE 1.498.930 AgR – reforço da jurisprudência quanto ao não cabimento de exceções ampliativas.

Esses julgados demonstram a coerência interna da jurisprudência do STF, que busca equilibrar a proteção de situações consolidadas com a responsabilidade fiscal e a limitação de retroatividade em casos de declaração de inconstitucionalidade.

Conclusão: fim da controvérsia sobre parcelas não pagas de quintos

O julgamento do RE 1.393.330 AgR/RS solidifica a tese de que o reconhecimento administrativo sem efetivo pagamento não gera direito à preservação da verba incorporada após a declaração de inconstitucionalidade. Com isso, o STF contribui para a estabilização da ordem jurídica e para o encerramento definitivo de litígios que desafiaram, por décadas, os contornos do regime remuneratório dos servidores públicos.

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