Da cassação da inscrição no cadastro de contribuintes do ICMS – Trabalho escravo

Wagner Constâncio
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O Plenário do Supremo Tribunal Federal, por maioria, conheceu da Ação e a julgou parcialmente procedente para assentar a constitucionalidade da Lei nº 14.946/2013 do Estado de São Paulo (1), conferindo interpretação conforme à Constituição aos seguintes dispositivos: (i) Arts. 1º e 2º da Lei nº 14.946/2013 do Estado de São Paulo, de modo a exigir a comprovação, em processo administrativo sob as garantias do contraditório e da ampla defesa, de que o sócio ou preposto do estabelecimento comercial sabia ou tinha como suspeitar da participação de trabalho escravo na cadeia de produção das mercadorias adquiridas; (ii) Art. 4º da Lei nº 14.946/2013 do Estado de São Paulo, de modo a exigir a comprovação, em processo administrativo sob as garantias do contraditório e da ampla defesa, de que o sócio a ser punido, sabendo ou tendo como suspeitar da participação de trabalho escravo na cadeia de produção das mercadorias adquiridas, haja contribuído, comissiva ou omissivamente, com a aquisição de aludidas mercadorias; (iii) § 1º do Art. 4º da Lei nº 14.946/2013 do Estado de São Paulo, de maneira que o prazo de 10 (dez) anos seja adotado como limite máximo, restando a norma com a seguinte dicção: “§ 1º – As restrições previstas nos incisos prevalecerão pelo prazo de até 10 (dez) anos, contados da data de cassação”, tendo ficado explicitado que o reconhecimento da ocorrência de trabalho análogo à escravização é feito pelo órgão federal competente.

A lei impugnada visou contribuir com a luta nacional contra o flagelo do trabalho escravo ou em condição similar à da escravidão.

Embora a norma não tenha feito menção expressa à necessidade de o empresário ter o conhecimento prévio ou a suspeita da participação de trabalho escravo na cadeia de produção das mercadorias, essa atecnia legislativa não torna o diploma legal incompatível com os valores da Constituição Federal. A omissão textual, portanto, não isenta a Administração Pública de demonstrar o dolo ou a culpa do empresário nem cria óbice à sua defesa fundada em justificativa plausível, com a simples prova da inexistência de indícios sobre a ilegitimidade da origem dos produtos por ele adquiridos.

Ademais, a tentativa de correção dessa falha por meio de decreto regulamentar é insuficiente, dada a possibilidade de sua revogação a qualquer momento por ato administrativo e monocrático do governador.

Nesse contexto, cabe ao Supremo Tribunal Federal aplicar a técnica da interpretação conforme à Constituição, a fim de afastar possíveis interpretações incompatíveis com os direitos e garantias individuais por ela consagrados.

Portanto, considera-se constitucional lei estadual que prevê a cassação da inscrição no cadastro de contribuintes do ICMS de empresas que comercializem mercadorias produzidas mediante uso de trabalho escravo ou em condições análogas a ele, desde que haja demonstração do dolo ou da culpa dos sócios empresários quanto ao conhecimento ou à suspeita dessa situação em processo administrativo no qual sejam observados os princípios do contraditório e da ampla defesa.

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