Fazenda Pública pode ser obrigada a apresentar cálculos em execuções nos Juizados Especiais

Wagner Constâncio
5 minuto(s) de leitura

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por unanimidade, que é constitucional exigir que a Fazenda Pública apresente os cálculos e documentos necessários para o início da fase de cumprimento de sentença no âmbito dos Juizados de Fazenda Pública. A decisão foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário 1.528.097/SP, com repercussão geral reconhecida no Tema 1.396, e estabelece um importante precedente sobre a chamada “execução invertida”.

Tese com repercussão geral reforça acesso à Justiça

A tese fixada pelo STF estabelece que:

“1. É possível exigir da Fazenda Pública a apresentação de documentos e cálculos para o início de cumprimento de sentença nos juizados especiais, nos termos da ADPF 219; 2. É fática a controvérsia sobre a hipossuficiência da parte credora para atribuição à Fazenda Pública do ônus de apresentação de documentos para início de execução de sentença em Juizados Especiais.”

Com isso, o STF reforça a aplicação dos princípios da celeridade, simplicidade e economia processual que regem os Juizados Especiais, contribuindo para um sistema de justiça mais acessível e eficiente — em linha com os objetivos do ODS 16 da Agenda 2030 da ONU, que trata de “promover sociedades pacíficas e inclusivas, com acesso à justiça para todos e instituições eficazes”.

Execução invertida: responsabilidade do devedor

Na prática, a decisão valida a possibilidade de “execução invertida” nos Juizados de Fazenda Pública — quando o juiz determina que a própria Fazenda apresente o valor atualizado da dívida e a documentação correspondente para dar início ao cumprimento da sentença. A medida, embora já adotada em diversas decisões de primeira instância, agora ganha força com o reconhecimento do STF.

A Corte destacou que essa prática já é comum nos Juizados Especiais Federais, conforme a jurisprudência firmada na ADPF 219, e deve ser replicada nas execuções envolvendo fazendas públicas estaduais e municipais.

Segundo o relator, ministro Edson Fachin, obrigar o cidadão a realizar cálculos complexos sem ter acesso aos dados contábeis e administrativos do poder público contraria os princípios que regem os juizados.

“É irrazoável impor ao credor, muitas vezes hipossuficiente, o encargo de apurar valores baseando-se em informações que somente a administração pública possui”, afirmou Fachin.

Matéria fática está fora da análise do STF

O STF também decidiu que não cabe à Corte analisar, caso a caso, se há hipossuficiência da parte credora para justificar a inversão do ônus de apresentação dos cálculos. Essa análise dependeria de elementos fáticos que estão fora do alcance do controle constitucional exercido pelo Supremo.

A discussão surgiu a partir de decisão da Turma Recursal do Estado de São Paulo, que obrigou a Fazenda Pública a apresentar o valor atualizado em cumprimento de sentença. A Fazenda recorreu ao STF, alegando violação ao princípio do contraditório e à regra geral de que cabe ao credor iniciar a execução.

Contudo, a Corte Suprema negou provimento ao recurso, consolidando o entendimento de que essa exigência não representa violação de direitos do ente público, mas sim uma medida de efetivação da justiça.

Impacto prático: menos burocracia e mais agilidade

Especialistas em direito público e processual veem a decisão como um marco para desburocratizar a execução de sentenças contra o Estado, especialmente em causas de menor valor. A medida deve beneficiar principalmente aposentados, servidores públicos e cidadãos de baixa renda, que são os maiores demandantes nos juizados.

“A Fazenda tem melhores condições técnicas e acesso aos dados necessários para apresentar os cálculos. Essa decisão democratiza o processo e favorece a efetividade da Justiça”, avaliou a professora de Direito Processual da USP, Maria Tereza Aina Sadek.

Decisão fortalece Justiça eficiente e inclusiva

A decisão do STF representa mais um passo rumo à justiça eficiente e acessível, em sintonia com o ODS 16, que trata da promoção de instituições justas e eficazes. Ao afirmar que o poder público pode ser compelido a colaborar ativamente com a fase executória, a Corte desestimula estratégias protelatórias e encurta o tempo de espera do cidadão por uma resposta efetiva do Judiciário.

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