Decisão do Plenário fixa tese sobre efeitos temporais de julgamentos com repercussão geral e estabelece parâmetros para ações rescisórias, com o objetivo de preservar a segurança jurídica
Brasília – Em decisão histórica, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) estabeleceu, no dia 23 de abril de 2025, importantes diretrizes sobre os efeitos temporais de seus próprios precedentes vinculantes, especialmente no que se refere à revisão de decisões judiciais definitivas — ou seja, já transitadas em julgado. A Corte fixou tese com repercussões diretas na aplicação dos artigos 525 e 535 do Código de Processo Civil (CPC), ao mesmo tempo em que declarou incidentalmente a inconstitucionalidade de trechos desses dispositivos.
A deliberação ocorreu no julgamento da questão de ordem na Ação Rescisória (AR) 2.876 QO/DF, relatada pelo ministro Gilmar Mendes. A Corte reafirmou que, embora tenha competência para declarar normas e interpretações inconstitucionais, essa prerrogativa deve ser exercida com cautela, considerando sempre o equilíbrio entre a necessidade de correção de decisões judiciais equivocadas e a preservação da segurança jurídica.
O que decidiu o STF?
A tese fixada determina que o § 15 do art. 525 e o § 8º do art. 535 do CPC devem ser interpretados conforme a Constituição Federal, com efeitos ex nunc (não retroativos, por padrão). Além disso, o Plenário declarou inconstitucionais o § 14 do art. 525 e o § 7º do art. 535, por entender que eles afrontam a estabilidade das decisões judiciais consolidadas.
A partir disso, foram estabelecidos três pontos centrais:
- Flexibilidade no tempo: O STF poderá, em cada caso, definir os efeitos temporais de seus julgamentos com repercussão geral, inclusive estabelecendo se uma decisão terá ou não efeitos retroativos — ou até mesmo se será cabível ação rescisória com base nela. Essa decisão levará em conta, entre outros fatores, o risco de lesão à segurança jurídica ou ao interesse social.
- Prazo de até cinco anos para rescisão: Na ausência de definição expressa por parte do STF, a eficácia retroativa de uma decisão será limitada aos cinco anos anteriores ao ajuizamento da ação rescisória. Essa ação, por sua vez, deverá ser proposta em até dois anos após o trânsito em julgado da decisão que se busca rescindir, respeitando o prazo decadencial previsto na lei.
- Arguição de inexigibilidade: Será admitida a alegação de inexigibilidade de um título executivo judicial baseado em norma ou interpretação posteriormente considerada inconstitucional pelo STF, mesmo que a decisão do Supremo tenha sido proferida após o trânsito em julgado da sentença exequenda. Essa prerrogativa é válida desde que não tenha ocorrido preclusão.
Implicações práticas
A decisão traz reflexos importantes para a Fazenda Pública, o Poder Judiciário e os jurisdicionados em geral. Na prática, ela amplia as possibilidades de revisão de decisões judiciais contrárias à Constituição, mas impõe limites rigorosos para evitar o colapso da estabilidade judicial.
Ministros divergiram pontualmente quanto à abrangência da retroatividade das decisões, especialmente no segundo ponto da tese. Contudo, prevaleceu o entendimento de que a Corte deve ter margem de discricionariedade para definir, caso a caso, os efeitos temporais de seus julgamentos.
Contexto normativo
O julgamento envolve a interpretação dos artigos 525 e 535 do CPC, que tratam das hipóteses de impugnação à execução de títulos judiciais. As alterações promovidas pelo STF pretendem dar maior coerência ao sistema processual, alinhando-o ao regime constitucional de precedentes e à função contramajoritária da Corte no controle de constitucionalidade.
Próximos passos
Com a questão de ordem resolvida, a análise do mérito da AR 2.876 será realizada à luz da tese agora firmada. A decisão também deve servir como referência para outras ações rescisórias em curso ou futuras, além de orientar juízes e tribunais sobre os limites da inexigibilidade de títulos judiciais baseados em normas inconstitucionais.
A medida sinaliza a contínua busca do STF por aperfeiçoar os mecanismos de controle de constitucionalidade sem desestabilizar o sistema jurídico — missão especialmente sensível em tempos de alta litigiosidade e judicialização de políticas públicas.